Manchete do ESTADÃO: Com queda no preço dos alimentos, população de baixa renda volta às compras
Depois de passar dois anos consumindo apenas o
básico, as famílias de baixa renda estão aos poucos retomando as compras. O
recuo no preço dos alimentos, que pesa mais no bolso dos mais pobres, está
abrindo espaço para gastos que até pouco tempo essa parcela da população não
pensava em fazer, como comprar um eletrodoméstico novo ou trocar o carro usado
por um melhor.
Os dados oficiais ainda não capturaram o efeito que
o aumento do poder de compra das famílias de baixa renda teve no consumo nos
últimos meses, por causa da queda da inflação. Mas uma série de indicadores já
apontam nessa direção. Em setembro, o fluxo de pessoas nos shoppings do País
teve o maior crescimento desde 2015, puxado pelos shoppings populares.
Trabalhadores que ganham até dois salários mínimos são maioria entre os que
limparam o nome no serviço eletrônico da Serasa Experian. E nas lojas de eletrodomésticos,
outro sinal concreto: a venda de TVs básicas, por exemplo, está crescendo mais
do que a dos aparelhos mais sofisticados.
As mudanças no
cenário mais favorável ao consumo começaram em meados do ano, quando a
inflação, especialmente a dos brasileiros de menor renda, bateu no fundo do
poço. Em junho, tanto o custo de vida das famílias que ganham até R$ 4.685,
medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), do IBGE, quanto as
com renda de até R$ 37.480, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo
(IPCA), registrou deflação. Mas a queda maior ocorreu entre os mais pobres. O
INPC caiu 0,30% em junho, enquanto o IPCA recuou 0,23% no mesmo período. De lá
para cá, o cenário só tem favorecido os mais pobres. Em agosto e setembro, o
INPC teve deflação, enquanto o IPCA foi positivo, porém em níveis baixos.
O quadro nem sempre foi assim. Em janeiro de 2016,
quando a inflação estourou por causa dos alimentos e atingiu 11,31% em 12
meses, o índice dos mais pobres estava acima da inflação da classe média.
“Agora a situação se inverteu e é uma mudança qualitativa importante”, diz o
professor da Faculdade de Economia da USP Heron do Carmo. Quando a inflação
perde força, diz Heron, o padrão de vida melhora. E as famílias mais pobres,
pelo fato de gastarem praticamente toda a renda com itens básicos, ganham um
alento para comprar outros produtos. “São os R$ 20 a menos gastos com
alimentação que pagam a prestação do tanquinho.”
Pontapé. O movimento nos corredores de grandes
centros comerciais já mostra essa tendência. O fluxo de pessoas nos cerca de
500 shoppings do País cresceu 4,4% em setembro em relação ao mesmo mês de 2016,
aponta o indicador do Ibope Inteligência e da Mais Fluxo. Foi o maior
crescimento desde abril de 2015 e puxado pelos shoppings populares, frequentado
por famílias com renda média mensal de R$ 5 mil. Nesses shoppings, o fluxo
cresceu 7,2% em setembro. “Fiquei surpresa com a intensidade do resultado”, diz
Marcia Sola, diretora do Ibope Inteligência.
Entre julho e setembro, quando a tendência de
inflação menor para os mais pobres se consolidou, 12,5 milhões a mais de
pessoas circularam nos shoppings populares em relação ao mesmo período de 2016.
É quase o dobro do fluxo adicional de pessoas registrado nos shoppings de
classe média. “Sem fluxo não tem venda”, diz Marcia.
Outro sinal de que os mais pobres planejam ir às
compras apareceu nas renegociações de dívidas. Em junho, 70% dos inadimplentes
que limparam o nome no serviço eletrônico da Serasa Experian ganhavam até dois
salários mínimos (R$ 1.874). “Com o alívio na inflação, consumidores
conseguiram renegociar dívidas, pois precisam de crédito para comprar”, diz
Raphael Salmi, diretor da Serasa.
Movidas a crédito, as vendas de eletroeletrônicos
refletem a retomada gradual das compras pelos consumidores de menor
renda. Entre janeiro e julho deste ano ante igual período de 2016,
vendeu-se mais TV básica de 32 polegadas, produto de entrada, do que modelos
mais sofisticados, observa Gisela Pougy, gerente de marketing da GfK. A tendência
se repetiu nos smartphones e nos tanquinhos em relação às lavadoras
automáticas.
Economistas enfatizam que não se trata de uma nova
onda de consumo popular porque o desemprego continua alto, com 12 milhões de
pessoas sem trabalho. Mas é consenso que o consumo das famílias como um todo
vai puxar a economia neste ano e no próximo, diante da fraqueza do investimento
para alavancar o Produto Interno Bruto
Fonte:Manchete do ESTADÃO: Com queda no preço dos alimentos, população de baixa renda volta às compras
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